quarta-feira, 21 de maio de 2014

Os ônibus incendiados e a responsabilidade do estado

Ao se pesquisar a respeito da responsabilidade do Estado por danos advindos de atos de vandalismo, principalmente para esses episódios previsíveis de incendiamento de ônibus, percebe-se que além de serem eventos repetitivos, muitos deles são anunciados previamente. O questionamento que se levanta é quanto à caracterização ou não de uma responsabilidade objetiva do Estado para seus atos omissivos.

Realmente, há boa parte da doutrina e da jurisprudência inclinada para o desiderato de que o Estado somente responde em casos de apuração de sua culpa subjetiva, vale dizer, que seus agentes tenham concorrido efetivamente para a ocorrência do dano. Por outro lado, as companhias seguradoras recusam-se a garantir os danos causados dessa forma.

Há um acórdão do Supremo Tribunal Federal em que se decidiu que o Município do Rio de Janeiro omitiu-se especificamente no seu dever de garantir a incolumidade física de alunos de sua rede pública de ensino, a partir de quando os mesmos ingressavam no recinto escolar. Na ocasião, condenou a Municipalidade a ressarcir prejuízos decorrentes de ferimento que cegou um aluno, provocado por seus colegas, durante o horário escolar e dentro do estabelecimento de ensino público. No seu voto o Ministro CELSO DE MELLO disse: “As circunstâncias do presente caso – apoiadas em pressupostos fáticos soberanamente reconhecidos pelo Tribunal a quo – evidenciam que o nexo de causalidade material restou plenamente configurado em face do comportamento omissivo em que incidiu o agente do Poder Público (funcionário escolar), que se absteve de adotar as providências reparatórias que a situação estava a exigir. Na realidade consta nos autos que, por incompreensível omissão administrativa, não só deixou de ser solicitado e prestado imediato socorro médico à vítima, mas, também, absteve-se a própria administração escolar de notificar os pais da aluna atingida, com a urgência que o caso requeria.” (os grifos são nossos). Perceba-se que o julgado concluiu pela responsabilidade municipal fulcrado na obrigação que os agentes públicos tinham de proteger a incolumidade física dos estudantes. O descumprimento desse dever é que constituiu a chamada omissão específica, que deu ensejo à obrigação de indenizar pelo critério objetivo. Por isso que, naquela oportunidade, a inércia da Administração foi causa direta e imediata do não impedimento do evento. Isso leva à conclusão que o ponto frágil para essa responsabilização do Estado está em que, no caso dos ônibus, não há uma vigilância específica pela segurança dos mesmos e que, se houvesse, geraria a responsabilidade objetiva do Estado. Conclui-se, portanto, que não basta uma obrigação em termos de segurança pública de toda a comunidade, mas uma obrigação especifica para se fugir da responsabilidade subjetiva. Boa parte da doutrina parte das premissas que o Estado tem o dever constitucional de manter a ordem e a segurança públicas diante desses episódios previsíveis (porque repetitivos)e, ipso facto, poderia se imputar a ele a responsabilidade objetiva reclamada no ato omissivo de não dar a ordem e a segurança especificas para os concessionários de transporte urbano, serviço esse essencial à comunidade. Há uma corrente, ainda, que incorpora o fundamento da responsabilidade estatal objetiva no “princípio da solidariedade social e da igualdade de encargos”, pelo qual “a responsabilidade do Estado será sempre objetiva, qualquer que seja a natureza da conduta (comissiva  ou omissiva), de seus agentes”. A vingar esse entendimento, bastaria ao permissionário somente fazer a prova do dano, da conduta danosa do Estado e do nexo de causalidade para se ver ressarcido dos prejuízos suportados. Ainda segundo esse entendimento, o Estado  para elidir tal responsabilidade, teria que fazer prova que o dano foi ocasionado por força maior, caso fortuito, estado de necessidade ou culpa exclusiva da vítima ou de terceiro – o que efetivamente não se dá. Diante disso, parece-nos plausível a possibilidade de os concessionários/permissionários de transporte urbano fazerem uma notificação premonitória ao Estado, via Secretaria de Segurança ou de Transportes, para apontar as linhas que estão mais afetas aos atos de vandalismo, solicitando especificamente a vigilância de carros patrulha armados, numa tentativa de – se ocorrer o dano, caracterizar a culpa especifica do Estado e, portanto, sua responsabilidade objetiva.

SARITA VON ZUBEN BARACCAT é advogada, responsável pelo Núcleo de Transportes Públicos da RMO-ADVOGADOS ASSOCIADOS

quinta-feira, 15 de maio de 2014

Penhora não pode atingir valor integral em conta conjunta se apenas um titular sofre execução

Não existe a possibilidade de penhora integral de valores depositados em conta bancária conjunta quando apenas um dos titulares é sujeito passivo de processo executivo. De acordo com decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o ato praticado por um dos titulares não afeta os demais nas relações jurídicas e obrigações com terceiros.
Em julgamento de recurso especial interposto pelo autor da execução, o ministro relator, Luis Felipe Salomão, manteve o entendimento do tribunal local de que, em processo executivo, a penhora deve afetar apenas a parcela pertencente ao devedor. Caso não seja possível determinar a proporção pertencente a cada parte, deve ser penhorada apenas a metade do saldo disponível, em se tratando de dois titulares.
Seguindo o voto do relator, a Quarta Turma entendeu que, caso não seja possível comprovar os valores que integram o patrimônio de cada um dos envolvidos, presume-se a divisão do saldo em partes iguais. Tal interpretação levou ao não provimento do recurso em que o autor da ação pedia a penhora integral dos valores na conta, como havia determinado o juizo de primeira instância.
No caso deste recurso especial, a recorrida não conseguiu provar que os valores bloqueados pela sentença seriam de sua propriedade exclusiva, provenientes da venda de um imóvel do cônjuge falecido e de sua aposentadoria, voltadas para seus tratamentos de saúde. Segundo ela, o filho - devedor executado - seria cotitular apenas para facilitar a movimentação do numerário, uma vez que ela tem idade avançada e sofre com o mal de Alzheimer.
Conta coletiva
O relator explicou que as contas bancárias coletivas podem ser indivisíveis ou solidárias. As do primeiro tipo só podem ser movimentadas por todos os seus titulares simultaneamente, sendo exigida a assinatura de todos, ressalvada a atribuição por mandato a um ou mais para fazê-lo. Já a solidária permite que os correntistas movimentem isoladamente a totalidade dos fundos disponíveis.
No julgamento da Quarta Turma, o caso era de uma conta conjunta solidária entre mãe e filho. O ministro Salomão destacou que nessa espécie de conta conjunta prevalece o princípio da solidariedade ativa e passiva, mas apenas em relação ao banco - em virtude do contrato de abertura de conta-corrente -, de modo que o ato praticado por um dos titulares não afeta os demais nas relações jurídicas e obrigacionais com terceiros.

Esta notícia se refere ao processo: REsp 1184584
Fonte: SRJ